quarta-feira, 22 de outubro de 2008

ANÁLISES SOBRE O MATERIALISMO HISTÓRICO

  • Trabalho elaborado para seminário de Polítca II na Universida fundação Santo André em 21/10/2008, por: Kazé; Tornado e Maíra.
INTRODUÇÃO(1)

O presente seminário tem como base cartas trocadas por Marx e Engels com diversos de seus contemporâneos – os quais serão citados no decorrer da apresentação -, tendo como foco, discussões referentes ao materialismo histórico.

A 1° edição do dicionário de sociologia globo (1961) dá uma definição bastante sintética do que é o Materialismo Histórico; sendo ela: Doutrina social-filosófica que considera as formas de produção econômica como os únicos fatores realmente determinantes do desenvolvimento histórico e social. As demais esferas culturais, como moral, direito, religião, Estado, ciência, arte e filosofia são meras derivações que representam uma espécie de superestrutura – (ou seja) complexo das ideologias de determinada classe social dominante numa sociedade - sobre a infra-estrutura econômica.

É preciso ressaltar, no entanto, que economia é fator determinante sobre as demais esferas, quando a assumimos em última instância; uma vez que, se colocarmos em questão que a política – por exemplo – determina de certa forma a economia, ao mesmo tempo em que, a economia determina a política; essa ambigüidade somente é desemaranhada, no momento em que assumimos um sistema dialético, onde, em ultima instância – ou seja, em última análise – o sistema econômico (responsável pela divisão classista do aparato social) é o fator realmente determinante do desenvolvimento social.

Antes de prosseguir, é necessário retroceder um pouco para um melhor entendimento: O que é o MATERIALISMO? Materialismo é toda concepção filosófica que aponta a matéria como substância primeira e última de qualquer ser, coisa ou fenômeno do universo. Para o materialista, a única realidade é a matéria em movimento, que por sua riqueza e complexidade, compõe desde a pedra até a emoção e a consciência. Dessa forma, o materialismo contrapõe-se ao idealismo, cujo elemento primordial é a idéia, o pensamento ou o espírito.

Já no séc. VI a.C., filósofos pré-socráticos argumentavam que a filosofia devia explicar os fenômenos pela observação da realidade. Podemos tomar como exemplo o pensamento de Tales de Mileto, entre outros. A historiografia do Materialismo não vem ao caso no presente discurso, uma vez que o intuito desta introdução, é exatamente dar parâmetros para passarmos as já citadas cartas. De qualquer forma, a breve descrição instaurada nessa introdução torna-se pertinente, inclusive, pela atualidade das culminâncias referentes ao pensamento materialista: Demócrito, foi o percussor da tradição materialista ocidental, no séc. V a.C., afirmando que tudo que existe compõe-se de átomos em constante movimento. Como dito, a pertinência desse tipo de informação cabe aqui (de certa forma) em nível de curiosidade; mas a própria descoberta por parte de Demócrito de átomos em movimento, comprova com excelência a eficácia da observação do mundo amparada na realidade e não nos mitos religiosos;, isso é base de comprovação para a plenitude do sistema não-idealista. Uma vez que, a observação em pauta é de suma importância para a ciência ainda nos dias de hoje – ainda que provado que o átomo não constitui a menor parte da matéria, segundo a contemporânea (e elevada a status de super-star) teoria quântica.

No entanto, voltando ao foco principal, que é a expressão Materialismo Histórico. Ela foi introduzida pela primeira vez por Engels em seu livro Anti-Duhring, quando afirma que: “a concepção materialista da história parte do principio de que a produção e, junto com ela, o intercâmbio de seus produtos constituem a base de toda ordem social [...] as causas últimas de todas as modificações sociais e das subversões políticas não devem ser procuradas nas cabeças dos homens [...] mas nas transformações dos modos de produção e de intercâmbio”. Ou seja, a base de toda constituição social está amparada na atividade prática de seres sensíveis em constante contato entre si, e não, na idéia pressuposta presente na mente dos homens enquanto seres vivos determinados, como afirmam os idealistas. Podemos utilizar de uma citação que explicita mais claramente o teor histórico e a ligação buscada por Marx e Engels, deste, com os modos de produção; lê-se no Manifesto do Partido Comunista: “Toda a história da sociedade humana, até os nossos dias, é a história da luta de classes”. Através dessa citação, podemos afirmar então que no pensamento materialista da história, o elemento determinante é, fundamentalmente a produção e a reprodução da vida real, amparada na situação econômica; já que, “Toda a história da sociedade humana, até os nossos dias, é a história da luta de classes”, devido exatamente a estrutura econômica estar baseada fundamentalmente numa estrutura que torna emergencial a luta de classes devida exatamente a diferenciação de riqueza entre elas.

Embora Engels, tenha sido o primeiro a introduzir o termo Materialismo Histórico, em carta redigida e endereçada a Franz Mehring, Engels afirma: “o Senhor me atribui mais méritos do que mereço” [...] mesmo somando tudo que, com o tempo, eu possivelmente teria descoberto por mim mesmo [...] Marx descobriu com seu relance mais rápido e sua visão mais ampla”. Afirma ainda ser “facilmente superestimado” por ter tido a “sorte de ter trabalhado durante quarenta anos com um homem como Marx” – que nesse momento já faleceu. A carta na qual Engels afirma tamanha admiração para com Marx está contida em uma das cartas que a partir de agora, passamos a comentar.


F. Engels: Derivação, ação recíproca e causação em uma perspectiva dialética

Engels redige esta carta em Londres no dia 14 de julho de 1893 endereçada a Franz Mehring. O objetivo da citada carta é comentar o livro recebido por Engels - Legenda de Lessing –, redigido e também enviado por Mehring.

Engels inicia sua crítica como ele mesmo diz: “Começo com o final, o apêndice sobre o ‘materialismo histórico’”; neste momento Engels coloca-se como modesto afirmando à Mehring: “o Senhor me atribui mais méritos do que mereço”; continua afirmando ter em Marx o sujeito objetivo de suas descobertas, tendo como argumento que: “mesmo somando tudo que, com o tempo, eu possivelmente teria descoberto por mim mesmo [...] Marx descobriu com seu relance mais rápido e sua visão mais ampla”. Afirma ainda ser “facilmente superestimado” por ter tido a “sorte de ter trabalhado durante quarenta anos com um homem como Marx” – que nesse momento já faleceu.

Segue colocando que nesse mesmo momento do texto – de Mehring – onde se considera superestimado, o autor não deu o devido destaque “a ênfase principal, antes de mais nada, em derivar dos fatos econômicos básicos as concepções políticas, jurídicas e demais concepções ideológicas” dando assim “aos adversários um belo pretexto para erros e deformações” de suas idéias; coloca “Paul Barth” como “um exemplo flagrante” disso.

Coloca que a ideologia “é um processo realizado com consciência pelo assim chamado, pensador, mas com consciência falsa”, uma vez que “as autenticas forças propulsoras que o movem permanecem-lhe desconhecidas” justificando assim, que de outra forma não caracterizaria como “um processo ideológico”. Nesse momento do texto percebe-se claramente uma crítica a filosofia especulativa dos neo-hegelianos.

Engels afirma que essa “aparência de história autônoma” das ações objetivas práticas do homem, “cega a maioria das pessoas” fazendo da “ilusão burguesa [..] da instância última da produção capitalista [...] ser encarada simplesmente como uma vitória do pensamento”, excluindo disso toda a prática econômica que proporciona tal estado. Ele coloca esta crítica como sendo também a si mesmo, por ter deixado por diversas vezes tais fatos menos latentes em suas obras, como de fato deveriam estar. Porém, contínua seu texto, elogiando a forma como Mehring “liquida [...] o garotão superficial”, Barth na obra a qual comenta Engels nessa carta.

Coloca a obra de Mehring como sendo “de longe a melhor exposição existente sobre a gênese do Estado Prussiano” chegando a afirmar que “é a única boa” no âmbito detalhistico. No entanto, lamenta o autor não ter “podido abarcar logo também todo o desenvolvimento posterior até Bismarck”. Mas deixa a esperança de que Mehring “fará isso noutra ocasião”.

Engels coloca nesta altura do texto sua primeira discrepância com a obra do autor: sua interpretação quanto à fragmentação da Alemanha e o fracasso da revolução burguesa de XVI. Coloca, porém, que não considera errôneos os pontos que o autor apresenta, apenas acrescenta outros e os agrupa de modo um pouco diferente.

Ao estudar a história da Alemanha, Engels faz um paralelo ao desenvolvimento francês, devido ao fato de afirmar que lá “ocorre bem o contrario do que ocorre entre nós”. Segue expondo as características marcantes dessa comparação no intuito de chegar à consolidação do Estado nacional francês para criar o paralelo do “desmoronamento” do Estado nacional alemão “(se é que se pode chamar de Estado nacional ao ‘reino alemão’ dentro do Sacro Império romano)”. Engels faz exatamente esta analogia, devido ao fato de considerá-la “altamente vergonhosa para os alemães, mas, por isso mesmo tanto mais instrutiva”; afirmando ainda que desde que os trabalhadores alemães “colocaram a Alemanha na primeira fila do movimento histórico,” fica menos desconfortável “engolir o opróbrio do passado”.

No momento final do texto Engels ressalta uma característica do desenvolvimento alemão: o fato de que “nenhum dos Estados parciais, que repartiram a Alemanha entre si, é puramente alemão” mas colônias que se utilizaram de possessões estrangeiras não-alemãs. Finaliza colocando que a discussão a qual sito haver ocorrido no texto “prova o vivo interesse” que o texto de Mehring lhe despertou.



F. Engels: Necessidade e acidente na história

Engels redige esta carta em Londres no dia 25 de janeiro de 1894, endereçada a W. Borgius. Neste texto, Engels reponde duas questões levantadas por Borgius, possivelmente em texto elaborado por ele e publicado no mesmo periódico ao qual Engels dirige a replica. As questões em si não estão incluídas no texto; no entanto, fica claro afirmar que na primeira questão, Engels aborda as técnicas cientificas como sendo obra da necessidade humana. Diz Engels: “Se, como o Senhor afirma, a técnica depende grandemente da situação da ciência, esta depende ainda muito mais da situação e necessidade da técnica”; coloca claramente também uma ‘agulhada’ no pensamento neo-hegeliano que se difunde na Alemanha, quando afirma: “infelizmente na Alemanha tem-se acostumado a escrever a história das ciências como se elas tivessem caído do céu”.

Na segunda questão Engels aborda as condições econômicas. E coloca: “Nós vemos as condições econômicas como o que condiciona em última instância o desenvolvimento histórico. Mas a própria raça é um fator econômico”. E divide em dois pontos:

A) “O desenvolvimento político, jurídico, filosófico religioso, literário, artístico, etc..., baseia-se no desenvolvimento econômico.” Não, é claro, que sozinha a situação econômica seja a causa ativa e que todo resto sofra um efeito de passividade . Mas as necessidades das bases econômicas em última instância sempre se impõem.
B) “Os homens fazem eles mesmos sua história, mas até agora não como uma vontade global de acordo com um plano global, e isso nem mesmo numa dada sociedade bem delimitada.” Engels coloca nesse ponto que as aspirações humanas se entrecruzam e em toda sociedade o que domina é a necessidade. Cuja forma de objetivação e aparição é o acaso. E “a necessidade que aqui se afirma através de todo acaso, é de novo afinal, a econômica” Engels levanta também a seguinte questão: “Que um tal homem, e exatamente este, apareça nesta época determinada, exatamente neste país, é mero acaso. Mas se o riscamos do mapa, então existe aí a demanda de um substituto, e este substituto é encontrado, bem ou mal, mas com o tempo ele é encontrado.” Usa também como exemplo, Marx, para mostrar essa necessidade latente existente na sociedade que se objetiva de uma forma ou de outra caso existam condições para tanto: “Ainda que Marx tenha descoberto a concepção materialista da história [...] historiadores ingleses provam que isto era procurado, e a descoberta da mesma concepção por Morgan prova que a época estava madura para ela e que simplesmente tinha de ser descoberta.” Através disso Engels quer mostrar que quanto mais nos afastamos do terreno econômico, e se aproxima do ideológico abstrato, mais acasos encontraremos. No entanto se analisar-mos proximamente tais relações, veremos que mais adiante sempre nos depararemos com um âmbito econômico.

“Peço que não pese na balança do ouro cada palavra anterior, mas que dirija o olhar para o conjunto; lamento não ter tempo para escrever-lhe de modo tão elaborado quanto eu teria de fazê-lo para o público...”







CONCLUSÃO

O termo materialismo histórico, então, é completamente oposto à concepção idealista. Esta conclusão, sendo assim, delimita-se – de certa forma – a colocar as divergências ideológicas presentes entre estas duas concepções em pauta. Levando ainda, em alguns trechos, em consideração a perspectiva fundamental do pensamento materialista histórico/dialético, onde: a economia é uma superestrutura que – em última instância - se sobrepõe sobre todas as outras esferas sócio/culturais presentes na estrutura Estado/Social.

Finalizando então, através deste seminário, buscamos apontar que os homens e o seu mundo são produtos da atividade sensível de indivíduos determinados. Portanto, o ponto de partida é: os homens ativos, numa conexão social dada. Sem atividade sensível pratica, realizada por indivíduos determinados, sem indivíduos ativos, relacionados uns com os outros, numa conexão social dada não há ser humano. A consciência se desenvolve, ao mesmo tempo em que é determinada pelo desenvolvimento das demais capacidades humanas, ou seja, da multiplicidade das atividades sensíveis que vão sendo desdobradas, e da multiplicidade dos intercâmbios entre os homens, que vão (a partir desta de forma intrínseca) sendo também desdobrados.

O pensamento especulativo supõe que as idéias de alguma maneira determinam à realidade, o imperativo nesse sentido tem por base não evidentemente as próprias idéias, mas o modo particular pelo quais os homens realizam o trabalho; de pronto, essa concepção cinde numa divisão entre trabalho material e trabalho espiritual.

Esta divisão, permite à consciência supor-se autônoma em relação ao mundo. Então, o fato de que o trabalho espiritual caiba não a todos os homens, mas somente a uma parcela deles, permite supor que a consciência de fato pode estar desligada da atividade material, ou seja, da atividade sensível.

A consciência pode supor-se autônoma na medida em que se estabelece uma divisão do trabalho material e do trabalho espiritual, supondo-se autônoma ela pode entrar em contradição com o mundo; essa contraposição, decorre por sua vez também do modo como esse mundo está sendo conduzido pela atividade tática dos homens, ou seja, decorre das contradições estabelecidas entre: forças produtivas e relações sociais. Tal contradição, se dá ao longo da história em diferentes momentos. Sua presença permite que se estabeleça uma contradição entre a própria consciência e o mundo.

Estabelecida esta base material da consciência e explicada a base do pensamento especulativo, Marx pode afirmar, que além da consciência propriamente dita toda riqueza espiritual dos indivíduos depende da riqueza de suas relações sociais.

A capacidade humana precisa ser produzida em primeiro lugar, para que cada um ao mesmo tempo em que as produz, seja também capaz de ter a condição de fruir esta produção.

Os homens ao mesmo tempo em que produzem uma multiplicidade cada vez maior de capacidades, aumentando seu intercambio na intenção de produzir um intercambio universal, acabam que: ao produzir estas capacidades produzem também a si mesmos, como indivíduos capazes de fruir estas capacidades.

A consciência só pode ser explicada pela práxis material, portanto, qualquer questão que diga respeito à vida humana deve ser trazida para esta atividade que envolve a consciência e todas as capacidades espirituais e filosóficas.




(1) - Analisamos aqui cartas trocadas por Engels com Franz Mehring e W. Borgius; presentes no livro: “Grandes Cientistas Sociais” – 36; organizado por Florestan Fernandes.

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